Sono, Dor e Disfunção - Um entendimento psicossomático

O sono ocupa cerca de 1/3 da vida. Em cada dia, a oscilação entre os diversos estados de sono permite a recuperação energética e regulação de vários sistemas fundamentais para a manutenção da saúde e da qualidade de vida. O sono inadequado ou insuficiente está associado a um aumento do risco cardiovascular e metabólico relacionado com a doença e a morte prematura.

Unidade de Sono e Disfunção do Instituto Prof. Dr. Antônio Sérgio Guimarães de Reabilitação Oral do Paciente com DTM.

Uma percentagem significativa de pacientes com DTM e Dor Orofacial apresentam queixas de sono. Por outro lado, é conhecida a relação entre o sono inadequado e os distúrbios do sono com a dor, sobretudo na vertente crónica.

O compromisso que a relação entre dor e sono pode assumir na perspectiva clínica, é não só relevante para o diagnóstico como determinante da conduta terapêutica, sendo fundamental o trabalho transdisciplinar para o sucesso.

No âmbito odontoestomatológico, e em particular nas especialidades que cruzam a Dor Orofacial e Disfunção, são de assinalar, pela sua prevalência e relevância clínica:

Insônia

A incapacidade de dormir adequadamente e num tempo e duração aceitáveis configuram sistematicamente os quadros de insonia que, de acordo com a duração das queixas pode ser classificada como “de curto prazo” ou “cronica”. A insonia cronica é frequentemente associada a uma qualidade de vida afetada pela insatisfação e pela constante necessidade de intervenção clínica em diferentes domínios da saúde. Uma das preocupações surge associada ao consumo de medicamentos auto-prescritos e sem controle, alguns dos quais com risco efetivo de tolerância e de efeitos adversos não negligenciáveis. Na relação com a dor, a insonia ocupa um papel de inequívoca preponderância, sendo comum que o paciente com dor se apresente concomitantemente com queixas de insonia. Apesar da abordagem farmacológica ser requerida em determinadas circunstancias, e sob controloe clínico, a interação entre sono e dor beneficia de uma abordagem cognitivo-comportamental para o sucesso terapêutico.

O diagnóstico  correto é fundamental para a boa condução terapêutica da insonia.

Disturbios Respiratórios do Sono/Apneia do Sono

A apneia do sono, forma mais impactante dos distúrbios respiratórios do sono, reflete uma obstrução das vias aéreas que resulta numa insuficiência ventilatória com redução da disponibilidade de oxigenio arterial. Sendo muito frequente nesta condição, o ronco, quer pelo impacto social estigmatizante, quer pelo incomodo real a que se associa, é normalmente o principal motivo da consulta. A sonolência excessiva é também um sintoma muito frequente que se relaciona com um risco aumentado de acidentes. O ronco não é contudo obrigatório para o diagnóstico de apneia do sono (cerca de 20% dos pacientes com apneia não roncam) e o risco cardiometabólico, cognitivo e imunitário  a que a condição se associa requerem um diagnóstico precoce uma abordagem eficiente para diminuir as sequelas, quer em idade pediátrica, quer em idade adulta.

O uso de dispositivos orais, na criança e no individuo adulto podem, em alguns casos prevenir e noutros tratar as sequelas da SAOS. Através das forças musculares aplicadas durante o crescimento e desenvolvimento, ou da ação ortodôntica e por via de uma reposição mandibular na idade adulta, estes aparelhos auxiliam a função respiratória normalizando-a na maior parte das vezes e diminuindo a sonolência e o ronco associados.

Nos quadros de interação entre a patologia do sono e dor cronica, os aparelhos de avanço mandibular podem ter indicação para o tratamento eficaz, com melhoria do prognóstico de uma e de outra condição.

Disturbios dos Movimentos Associados ao Sono

Dentre os distúrbios motores mais frequentemente associados ao sono, existem: a Sindrome de Pernas Inquietas, os Movimentos Periódicos dos Membros durante o Sono e o Bruxismo do Sono. Todos partilham mecanismos etiológicos e a fisiopatologia comum permite que se estabeleça uma relação de inequívoco valor diagnóstico e terapêutico. Enquanto a Sindrome das Pernas Inquietas sucede em vigília, enquanto o paciente esta desperto, sobretudo no final do dia, altura em que a manifestação de urgência no movimento ou a inquietude é prefencialmente relatada, as outras condições são exclusivas do sono. No entanto, todas acabam por comprometer o inicio ou a manutenção do sono e por isso são incluídas nas doenças do sono. O tratamento pode ser médico ou psicológico em determinadas circunstâncias. Algumas formas ocorrem como epifenomenos do sono normal, não carecendo de terapêutica, enquanto outras constituirão risco efetivo para o sono e para outras alterações (por ex. cardiovasculares e endocrinometabólicas). Quando secundárias a um problema identificado, a abordagem da condição primária é indicada com uma taxa de sucesso apreciável.​